Sempre fui o tipo de pessoa que lê a última página de um livro. Não antes de começá-lo, mas quando estou no capítulo 3 ou 4 e já estou empolgada com o enredo e com os personagens, sempre vou à última página para ver o qual o último parágrafo. Só para eu entender como o livro vai terminar…
Na vida, não tem como ser assim. Eu sei disso. Aprendi isso há algum tempo: temos que viver o dia-a-dia, sem deixar que a ansiedade afete nossas decisões. Temos que olhar para as pedras que estão no caminho, para cada uma das flores pelas que passamos e, assim, tentar distrair nossos cérebros que, algumas vezes, não sabem a hora de parar de funcionar e nos deixar em paz.
E quando isso não funciona? Como acalmar os nossos cérebros e as nossas loucuras?
Digo isso porque estou conversando com uma amiga através do Whatsapp, um aplicativo maravilhoso que nos permite trocar mensagens de texto imediatamente, de graça, independente de onde estejamos. O fato é que ambas estamos passando por momentos um pouco instáveis nas nossas vidas. Ambas estamos perdendo a lucidez, temos vontade de fugir para Vênus e, nesse exato momento, quero sim ler o último parágrafo deste capitulo da minha vida e entender como ele vai acabar.
Há poucos dias, existia uma batalha entre os vários “eus” acontecendo dentro de mim. Posso reconhecer muitas desses “eus” que são versões minhas de quando era mais jovem… Já pude reconhecer o “eu” de 15 anos, que fazia ameaças vazias, o “eu” de 20 e poucos anos com seus distúrbios alimentares e o “eu” bomba-atômica, pronta para explodir. E todas elas querem deixar o meu “eu” de 34 anos maluco porque esses outros “eus” não param de gritar na minha cabeça.
Nesse momento, graças aos bons céus, elas estão dormindo (e vou acompanhá-las logo mais), descansando e parecendo anjinhos. Mas elas não são anjos. Quando elas decidem acordar todas juntas, sinto que vou enlouquecer. No momento em que todas elas começam a falar, a gritar ou a discutir entre elas, sinto que vou explodir… E então começo a chorar, louca e desesperada, porque acho que nunca vai passar.
Sentia como se o meu barco houvesse quebrado no meio de uma tempestade… E que eu estivesse tentando, desesperadamente, consertá-lo enquanto as ondas imensas me jogavam de um lado para outro. Sentia o desejo desesperador de sair daquele lugar, naquele momento, o mais rápido possível. Mas como é possível redirecionar um barco quebrado no meio de uma tempestade? Se eu tentasse, era muito possível que ele acabasse no meio das rochas, destroçado. E como é possível consertar um barco quebrado quando as ondas não deixam você parar para entender o que está quebrado e como se deve consertá-lo? Naquele momento, o que eu queria era só sentar e chorar…
Naquele momento, esqueci de respirar, não conseguia respirar. Então, o “eu” bomba-atômica explodiu. Embora acredite que tenha sido o melhor porque sinto que o pior da tempestade passou, fiquei com as conseqüências da sua passagem. Nesse momento, posso analisar o estrago que a tempestade e a explosão da bomba-atômica causaram. E o cenário que eu vejo não é nada bonito… A tempestade causou muito mais dano que eu podia imaginar e estou sofrendo de uma fortíssima ressaca emocional.
E, por isso, eu quero ler o ultimo parágrafo desse capítulo. Porque quero, desesperadamente, que ele acabe bem. Quero muito ler que o sol nasceu e que eu consegui consertar o que estava quebrado no meu barco e que, juntos, partimos para marés mais calmas… Mas, como disse minha amiga, mares calmos não formam marinheiros experientes…
A verdade é que acho que vivemos em uma era imediatista. Vivemos na era do micro-ondas, na qual queremos que o prato fique pronto em três minutos. E exigimos que esse prato tenha baixa quantidade de sódio, seja saudável e saboroso. Queremos que esse prato de três minutos nos alimente e seja tudo que precisamos comer durante o dia.
Mas, as coisas que merecem a pena na vida não podem ser preparadas em três minutos. E, muitas vezes, nos esquecemos disso. Todas as coisas que mais valem a pena nessa vida devem ser feitas lentamente, as melhores comidas devem ser cozinhadas em fogo-lento. Uma pessoa não pode esperar comer um coq au vin delicioso e preparado em três minutos. Isso não existe.
Tenho que lembrar que preciso respirar. Que, embora algumas vezes seja permitido que a bomba atômica exploda, sou a responsável por lidar com as conseqüências da sua explosão. E, que embora o cenário logo após a explosão possa ser feio, o tempo cura tudo. Ou talvez ele não cure, mas ele tira o incurável do centro das atenções. Com o tempo, a ferida cicatriza e a dor passa. Mas precisamos ter paciência, paciência para consertar o que quebrou (de forma decente, sem usar super-cola!), paciência para cozinhar o coq au vin. Porque, nesse momento, entendo que um prato de três minutos nunca vai ser o suficiente para me deixar completamente satisfeita. Mas preciso aprender dar tempo ao tempo…
Trotamundos by Tati Sato is licensed under a Creative Commons Attribution-NonCommercial-NoDerivs 3.0 Unported License.
Based on a work at https://tatisatotrotamundos.com/